25 março 2025

Reflexões sobre 40 Anos de Democracia: A Fragilidade da Transição Política Brasileira

26.03.2025


O historiador Daniel Aarão Reis Filho, um renomado especialista em história contemporânea, oferece uma análise crítica da transição política brasileira após a ditadura militar. Ele argumenta que a falta de uma justiça de transição teve consequências profundas para a consolidação da democracia no Brasil, permitindo que setores militares mantivessem uma autonomia excessiva, configurando um "Estado dentro do Estado".

A Transição Política de 1985

- Contexto Histórico: A transição começou com a morte de Tancredo Neves e a ascensão de José Sarney ao poder. Aarão identifica a revogação dos atos institucionais em 1979 como um momento crucial, que abriu caminho para a democracia, mais significativo do que a posse de Sarney em 1985.

- Análise da Posse de Sarney: Aarão observa que, apesar de Sarney ser um presidente civil, ele havia participado ativamente do regime militar, o que levanta questões sobre a verdadeira natureza da mudança política. A transição não representou o fim da ditadura, mas uma continuidade em um novo formato.

Participação Popular e Negociação

- Acordo entre Elites: Aarão enfatiza que a transição não foi completamente controlada pelos militares, pois eles perderam parte do controle do processo. A participação popular foi significativa, especialmente durante as greves do ABC entre 1978 e 1981, que mobilizaram grandes setores da sociedade.

- Comparações Regionais: O modelo de transição brasileira é caracterizado pela sua capacidade de absorver conflitos e contradições. Embora tenha privilegiado a negociação, a participação popular foi essencial, similar a processos em países como Chile, Uruguai e Argentina, mas com a diferença de que a transição brasileira foi menos abrupta.


O Papel de Tancredo Neves e José Sarney

- Governança e Estilo Político: Tancredo Neves é descrito como um político habilidoso e conciliador, enquanto Sarney tinha uma trajetória ambígua, tendo transitado entre a oposição e a liderança da ditadura. Aarão sugere que Tancredo, se tivesse assumido, poderia ter governado de forma mais firme e afirmativa.

- Impacto da Morte de Tancredo: A morte de Tancredo é vista como um fator que não teria gerado embates diretos com os militares, já que ele mantinha um bom relacionamento com as Forças Armadas, que já estavam sob o comando de generais comprometidos com a transição.

A Nova República e a Assembleia Constituinte

- Avanços e Limitações da Constituição de 1988: A Assembleia Constituinte de 1988 foi um marco importante, trazendo avanços significativos em direitos políticos, sociais e individuais. No entanto, muitos aspectos da estrutura da ditadura foram mantidos, especialmente no que se refere à autonomia das Forças Armadas.

- Autonomia Militar: A falta de uma justiça de transição resultou em uma autonomia excessiva das Forças Armadas, que continuaram a operar como um "Estado dentro do Estado", dificultando o controle civil e perpetuando a cultura da impunidade.

Reflexões sobre a Justiça de Transição

- Impacto na Consolidação da Democracia: Aarão argumenta que a ausência de uma justiça de transição teve um impacto negativo na consolidação da democracia no Brasil. Ao contrário de outros países da América Latina, onde houve julgamentos e responsabilizações, o Brasil optou pelo silêncio e pela impunidade, resultando em um pacto de esquecimento em relação aos crimes da ditadura.

- Possíveis Mudanças Jurídicas: Recentes interpretações jurídicas sobre crimes continuados podem abrir brechas para julgamentos dos crimes da ditadura, especialmente após a crise nas Forças Armadas em 2022, que pode sinalizar um novo momento na busca por justiça.


- Frustração com a Nova República: Aarão aponta que, embora o Brasil ainda viva sob um regime democrático, as expectativas criadas nos anos 80 não se concretizaram. A desigualdade social aumentou, e as elites econômicas permaneceram intocadas, gerando um profundo descrédito na política.

- Desafios Futuros e a Influência da Extrema-Direita: O crescimento da extrema-direita e a fragilidade da democracia atual são reflexos de uma transição que não blindou o país contra novas ameaças. Aarão conclui que, se a transição tivesse sido conduzida de forma diferente, com uma justiça de transição e punição dos crimes da ditadura, o Brasil poderia ter uma democracia mais sólida e justa hoje.

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